29 septembre 2006

Cronicas do Viajante Amargurado - Inversão de Papéis.

Pela noite dentro. Escrevo no computador portatil aquilo que, dentro de oito horas, sera a minha Memoire do Diploma que me propus fazer este ano. Sera por ter visto demasiados filmes americanos, mas sempre que me encontro sozinho em casa a altas horas da noite, começo a pensar em coisas parvas. Como por exemplo, se alguém vira roubar a casa ou qualquer coisa parecida. Tudo a puxar para o tétrico.
A porta abre-se.
Como eram quase quatro da manhã, pensei que o meu senhorio teria alugado a Chambre de Bonne ao lado da minha e que o meu novo vizinho, provavelmente algum estudante; chegava de alguma festa.
Chega um individuo, com os seus quarenta anos, o cabelo cinzento e crespo. Vestido com uma dessas camisolas a que costumamos chamar “de fato de treino” e umas calças cujo tecido não me lembro agora.
Que é que você quer? Diz-me de uma forma brusca.
Como achei que essa pergunta deveria ter sido feita por mim, comecei a gaguejar
Vi-vi-ve aqui?
Eu por acaso bati à sua porta?
Não, não é isso. Queria saber quem era..
. A situação era tão estranha que pensei estar a sonhar. O senhor foi-se aproximando até estar em cima do meu nariz.
Eu por acaso bati à sua porta? Hã?
Como não sabia que dizer, fitei-o durante momentos. Que estaria a acontecer? De onde saia este novo inquilino, demasiado velho para ser estudante sem casa e demasiado agressivo para quem vinha apenas a chegar.
Feche mas é a porta! Onde ja se viu isto? Ha? Ah, ah, ah, você é ridiculo!
E nisto fala com alguém, que pelos vistos, estava ja dentro do quato.
Se tem medo, chame a policia!
A sensação de estupidez foi depois substituida por outra, bem menos confortavel. Pânico. A tremer por todos os lados, telefonei para esse célébre numero europeu de segurança ou emergência. Seja como for, eram todos demasiado lentos naquela linha. Quando finalmente convenci o senhor de que poderia estar em perigo ( custou-me tanto que os tais visitantes a altas horas da madrugada conseguiram fugir pela porta fora), decidi esperar pelos tais policias ( dois fardados e um à paisana, segundo me explicou uma segunda pessoa ao telefone, com um ligeiro sotaque de Toulouse).
Corri tão depressa pelas escadas abaixo, que os policia fizeram-me uma espera. Quando vi os três, pensando que eram os visitantes de antes, dei um salto para tras e assustei-os uma segunda vez. Deve ter parecido tudo tão comico que até tenho vergonha so de pensar que algum vizinho poderia estar a ver.
- Pois, mas eles agora ja devem ter fugido.
Sabia conclusão, a deste jovem policia com background do sudoeste asiatico, sem duvida. Continuava a tremer e expliquei como tudo se passou aos dois “guardas”. Tomaram nota de tudo e de uma forma muito Zen, desapareceram como os meus amigos.
Decido ir contar tudo ao meu senhorio, que abre a porta imediatamente, pela primeira vez desde que vou ao seu andar para pagar a renda todos os meses desde ha um ano. A gata siamesa da sua senhora salta-me para as pernas como se quisessem fazer um festim de madrugada. Depois de explicar tudo, tenho de confrontar novamente as minhas àguas furtadas, sem luz, com as portas abertas e com gente que, como viemos a descobrir mais tarde, entra e sai pelas janelas modernas que instalou o meu senhorio, quando quer e bem lhe apetece. Decidi depois que aquele lugar era demasiado pequeno para terminar o trabalho e fui acabar o que ainda me restava a Saint Michel. Ando sempre à procura de historias unicas para poder enriquecer este blogue, sabem? Mas esta, preferia tê-la inventado completamente. Infelimente, é cem por cento verdade. Depois percebi que este gatuno, que vinha por coisas menores e que felizmente não estava a roubar no Utah ou no Arkansas, senão, acho que teria levado com um balazio na testa sem problemas. De qualquer maneira, ao tentar inverter os papeis, confundiu-me tão bem, que, se o quarto ao lado não estivesse vazio, teria roubado tudo o que la estivesse dentro. Mas o mais importante, Senhor Leitor, é que acabei o tal trabalho.

No Hexagono.


4 commentaires:

Lis a dit…

EXCELENTE.

Lis a dit…

Não entendeste.
Eu entendi.

MJB a dit…

TENS QUE VER O EPISÓDIO NUM CONTEXTO JEAN COUTEAUX OU TALVEZ NUM CENÁRIO DE DELIRIO EXISTENCIALISTA DE HOMENS MEIO PERDIDOS NUMA NOITE DE SETEMBRO... ETC...
SÓ ASSIM FOSTE PARA SAINT MICHEL TÃO CEDO! SÓ POR ISSO JÁ DEVE TER SIDO BOM!

intruso a dit…

o texto começou (literário) género Edgar Allan Poe e acabou ao estilo sarcástico "Michael Moore"...

bom post!